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Museu do automóvel: cultura e turismo para impulsionar a região


Rúbio Fernal: museu como espaço de preservação da cultura automobilística mundial e do Brasil, ao longo de cento e vinte anos.

Localizado em Carmo da Mata, a menos de 30 quilômetros de Oliveira, um dos maiores e mais completos museus automobilísticos do Brasil desponta como irresistível atração para turistas de todo o país e exterior. Relógios de quinhentos anos e cachaças centenárias completam esse raro acervo, cuja magnífica história e motivos são mostrados pelo seu criador, artífice e mantenedor, Rúbio Fernal Ferreira, nesta entrevista à GM.


Gazeta – O que é o Museu do Automóvel de Carmo da Mata?


Rúbio - O Museu do Automóvel de Carmo da Mata, que já vai, além dos veículos, para os relógios e cachaças, e no futuro terá uma grande maquete de trem elétrico, é um espaço de preservação da cultura automobilística mundial e do Brasil, ao longo de cento e vinte anos. Os primeiros automóveis surgiram na Europa em 1890, tornando-se populares nos Estados Unidos entre 1910 e 1912, com a linha de montagem introduzida pelo empreendedor Henry Ford. O museu é, também, um espaço de preservação e apresentação dos relógios ao longo dos últimos cinco séculos, contando uma história que já dura quinhentos anos. O museu mostra a evolução da técnica, da arquitetura e do desenho da indústria automobilística mundial. Cada modelo de automóvel precisa ser visto como uma evolução que se dava ano a ano, numa corrida frenética entre os produtores, para convencerem os mercados de que seus produtos eram os melhores, os mais duráveis, os mais bonitos. Assim é que há modelos que são ícones dessa evolução, O Museu de Carmo da Mata possui os cinco principais, que também estão em exposição no Museu de Nova Iorque.


Gazeta – Como nasceu essa ideia e quando ela começou a ser posta em prática?

Rúbio - A ideia de colecionar automóveis antigos surgiu muito cedo, antes dos meus dezoito anos. Nessa época eu queria conseguir um carro que dependesse de um processo de restauração, o que para mim seria um aprendizado de como fazer, de como identificar os melhores profissionais para realizar esse sonho, onde buscar peças e fazer com que aquilo durasse algum tempo, para que tivesse um significado pra mim. E assim foi. Logo depois de entrar para a escola de engenharia, encontrei um Ford 1929 bastante estragado e iniciamos a restauração, que me levou a Buenos Aires, a Nova Iorque, ao Estado da Georgia (EUA), atrás de peças. O carro ficou pronto em quatro anos e passou a ter uma pontuação altíssima entre os carros mais originais, mesmo sendo um modelo sem nenhuma importância colecionável, pois foi vendido aos milhões de unidades. Mas o objetivo era que fosse um aprendizado.


Gazeta – Por que a escolha de Carmo da Mata como local desse empreendimento cultural?

Rúbio - A ideia do museu, de juntar esses carros todos, é muito mais recente do que o início da restauração do primeiro veículo. Quando eu tive essa ideia já possuía entre quinze e vinte carros, isso há vinte e cinco anos. Eu já morava em Brasília e a primeira ideia era instalar o museu lá, pois o governo queria criar na capital federal um amplo espaço museológico de automóveis. Mas nesse tempo eu já frequentava Carmo da Mata, por força de meu casamento, em 1988, com a Mônica, cujo pai é natural do município. Lá também nasceu minha mãe. Meu sogro, cafeicultor, possuía um galpão na cidade, anteriormente usado para armazenar sacas de café, antes de seguirem, em transporte ferroviário, para exportação no Porto de Santos. Tive a ideia de restaurar esse pequeno imóvel, com menos de quinhentos metros quadrados, mas localizado num terreno maior, e ali erguer o museu, no sentido de, já naquela época, entre 1990 e 1992, pensando no embrião de algo grande, que trouxesse turismo, renda, movimentação cultural para a nossa região.


Gazeta – Quantos veículos compõem hoje o acervo, como estão distribuídos e como se deu o processo de aquisição deles?

Rúbio - O acervo atual do museu se divide em duas partes: os carros que já estão restaurados e expostos e os que ainda estão em processo de restauração. Precisamos levar em conta que esse é um trabalho de mais de cinquenta anos, Se imaginarmos a conclusão de processos de restauração de dois ou três veículos por ano, isso nos leva a um acervo de aproximadamente 150 veículos, todos registrados e em ordem de marcha, o que significa que basta colocar combustível, ligar as baterias, recalibrar os pneus e estão todos prontos para rodar. Esta é uma característica única, porque na grande maioria dos museus os carros não estão aptos a serem movimentados. O museu de Carmo da Mata é um espaço de preservação e não apenas de visualização, de um bem mecânico apto a oferecer aquilo para o qual foi construído, ou seja: funcionar, se deslocar e transportar. A busca por eles se deu de forma permanente, sempre atento ao que havia no mercado, tanto no Brasil como no exterior, especialmente nos Estados Unidos, que é o grande centro mundial de carros antigos, uma indústria que movimenta bilhões de dólares anualmente.


Gazeta – Quais as preciosidades da história do automóvel podem ser destacadas na coleção? Esses carros ainda funcionam?

Rúbio - Sim. Há alguns exemplares que nós podemos chamar de preciosidades. Começando pela indústria nacional, com o primeiro Willys Itamarati Executivo fabricado no Brasil, com o número 0001, que foi exposto no Salão do Automóvel de 1967 e vendido para o governo do Estado do Paraná. Um exemplar de um dos três únicos Volkswagen (Fusca) conversíveis produzidos no Brasil sob encomenda, no lançamento da série Itamar. Quanto aos carros estrangeiros, são muitas as preciosidades, com destaque para um Ford 1910, um dos primeiros carros fabricados em linha de produção em todo o mundo, talvez o primeiro a chegar ao Brasil. Há um Hispano Suiza 1927, que é um veículo lendário e extremamente raro. Há alguns exemplares de veículos de alto luxo, como Rolls-Royce, Packard, também muito raros; um Fiat Speciale 1951, que é único. Há um Delahaye 1937, que tem toda uma bela história de sua vinda da França para o Brasil, de uma senhora que fugia da Segunda Guerra Mundial. Há também um Horch 1939 fabricado em raríssimas unidades na Alemanha, muito certamente enviado pelo governo alemão ao governo brasileiro. Já as crianças apreciam muito um Hudson 1951 conversível, que foi usado pelos Estúdios Disney no filme “O Automóvel”.

Gazeta – Além dos veículos, o museu também reúne uma grande coleção de relógios. Fale um pouco sobre eles.

Rúbio - O museu reúne, também, uma grande coleção de relógios de parede e de mesa. Os mais antigos datam dos séculos XVI e XVII e têm um só ponteiro, pois não faziam máquinas em nível comercial com dois ponteiros. Há um relógio grego muito antigo, chamado de Clepsidra, que é movido a água. E há aqueles que começam a ficar muito interessantes, entre os séculos XVII e XVIII, feitos a mão, levando anos para que fossem finalizados pelos artesãos relojoeiros. Há grandes exemplares de máquinas de altíssima complexidade. Também há os famosos relógios cucos da Baviera, na Floresta Negra alemã, de madeira entalhada a mão, a grande maioria com motivos de caças. Lá estão também os relógios de coluna, utilizados nas fazendas; relógios de mesa franceses, ingleses, que marcaram época nos grandes palácios, castelos e edifícios públicos. Uma grande curiosidade é o relógio IBM elétrico dos anos 1930, que marcou a hora do Brasil durante muitos anos, até 1990, quando foi substituído por um relógio atômico.O museu dispõe, ainda, dos relógios de convento, com máquinas alemãs, mas fabricados em Portugal. São muito bonitos, ilustrados com freiras, frades e santos e que batem os sinos. Chamamos a atenção para o fato de que os relógios foram os objetos de desejo da humanidade durante muitos séculos. Os maiores produtos de exportação dos Estados Unidos, por volta dos anos 1880, eram os relógios.


Gazeta – O museu é dinâmico? Ainda está em processo de crescimento?

Rúbio - O museu é extremamente dinâmico, primeiro porque sempre uma nova providência, um novo assessório é acrescentado aos veículos em exposição. Em segundo lugar porque novos veículos estão sendo restaurados, para em seguida serem introduzidos na coleção à mostra, o mesmo podendo dizer de relógios e cachaças em aquisição. Além disso, o museu vai sofrer uma expansão física, já estando adquiridos dois terrenos adjacentes, para que os veículos sejam distribuídos de forma melhor por marcas e décadas. E um terceiro piso envidraçado, com vista para a cidade, onde será construída uma grande maquete de trens elétricos em pelo menos três escalas. Vale lembrar que as maquetes de trens são algumas das maiores atrações em grandes museus de automóveis espalhados pelo mundo. No Brasil temos o exemplo de Gramado e Canela, e agora Balneário Camboriú e Pomerode, com museus de automóveis abertos, que atraem muitos visitantes.


Gazeta – E nesta mistura de culturas, temos também uma rara coleção de cachaças. O que significa este acervo de bebida?

Rúbio - Essas cachaças estão lá porque meu pai as colecionou, algumas vindas do meu avô, de tios, parentes e amigos. Temos cachaças muito antigas, um grande número delas de 1951, ano em que eu nasci e em que meu pai encomendou a uma tia, que fazia uma viagem pelo Rio São Francisco no vapor Benjamim Guimarães, uma grande quantidade de cachaças dos alambiques das barrancas do São Francisco, sobretudo de Januária. Elas seriam guardadas, para que eu as pudesse usar muitos anos à frente. O fato de meu pai não beber, como também eu, nos permitiu guardá-las. É uma belíssima coleção, com cachaças dos mais variados tipos e localidades de Minas e do Brasil. Há cachaças com mais de cem anos e muitas outras com mais de cinquenta anos. Muito interessante uma visita geográfica pelos rótulos das cachaças indicando as localidades onde foram alambicadas. Com isto a gente consegue percorrer uma grande parte dos mais de oitocentos municípios de Minas.


Gazeta – O Museu está aberto à visitação? Há alguma restrição de acesso?

Rúbio - Sim, está aberto. Todos que desejarem visitar o museu terão acesso a ele. Temos guias preparados, não sendo permitida a visita individual, pois o visitante precisa ser conduzido aos diversos salões, receber as informações mínimas necessárias. O museu não está de portas abertas ao público diariamente, mas existe uma informação de telefone na entrada, para que o guia venha receber os visitantes. Pedimos aos visitantes que não façam filmagens para serem postadas na internet. Permitimos algumas fotos no interior de pessoas próximas a veículos de que mais gostem, Filmagens postadas na internet vulgarizam a coleção e muitas vezes não são feitas adequadamente e sob critérios técnicos.


Gazeta – Qual a importância social e econômica do Museu do Automóvel de Carmo da Mata para o Centro Oeste de Minas?

Rúbio - Nós entendemos que a importância desse museu, localizado em Carmo da Mata, no centro do Centro Oeste Mineiro, na grande região dos Campos das Vertentes, onde há convergência de alguns circuitos turísticos, é de fundamental importância, para nós criarmos e consolidarmos um grande polo turístico, por meio de todas as manifestações e investimentos que já temos, com diversos hotéis, hotéis-fazendas, represas em Cláudio e Divinópolis, centro histórico de Oliveira, fazendas de café, cachoeiras, trilhas rurais, tudo isto constitui um polo de atrações turísticas, e o museu vem se juntar a ele. Lembremos que em torno de museus de automóveis se consolidaram grandes polos turísticos. Por outro lado, o nosso museu está associado ao instituto ICAFE, de grande alcance social, dirigido por Mônica Borges de Souza, que tem como objetivo estar ao lado das populações rurais, e agora também das urbanas de toda a região, no sentido de trazer conhecimento, trabalho, e, portanto, renda, fixação do homem ao seu local de pertencimento. O instituto já implementou programas que beneficiaram mais de 1.700 pessoas. O que se arrecada na visitação ao museu é destinado ao ressarcimento do tempo dos guias e integralmente destinado ao provimento de fundos para o ICAFE.

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